quarta-feira, abril 20, 2005

Disfunção eréctil

Gostei do Texto, acheio giro de se ler.


Disfunção eréctil

Mário Bettencourt Resendes*


Gozo, há meia dúzia de meses, as «delícias» da vida no centro de Lisboa. O meu bairro, Campo de Ourique, é, por sinal, um dos mais tradicionais e agradáveis da capital. Tem restaurantes bons e baratos, outros ainda melhores e nem por isso particularmente caros, há comércio de qualidade em vários ramos, cafés simpáticos, pelo menos um jardim acolhedor. Os moradores mais antigos tratam com afabilidade os recém chegados e conservam o espírito solidário – por vezes a roçar a intromissão... – característico da Lisboa de outros tempos.

Para quem se instala habituado ao desafogo das vias de algumas zonas da periferia, o trânsito é o maior inferno de Campo de Ourique. O estacionamento processa-se de forma selvagem, bloqueia-se o acesso a garagens, dificulta-se a entrada em ruas mais estreitas, obrigando os condutores a exercícios de risco em matéria de golpe de vista, enfim, é bom nem pensar o que pode suceder em algumas travessas de Campo de Ourique se um incêndio nocturno exigir a presença urgente de carros de bombeiros.

Campo de Ourique tem ainda outra praga, porventura menos falada, mas que funciona como autêntica tormenta para quem não é obrigado a acordar às seis horas da manhã. Todas as madrugadas, os pombos do bairro escolhem, entre outros lugares de pouso, a janela do meu quarto de cama para exercícios ruidosos. A instalação externa do aparelho de ar condicionado proporciona um cantinho recatado que as aves destinaram a um ninho de amor ideal.

Nos primeiros tempos, decidi encarar com tolerância o romantismo «pombalino» e convenci-me de que, com o passar dos dias, acabaria por habituar-me. Falso: há muito que não sei o que é uma noite bem dormida e consolidei uma enorme aversão aos avanços sexuais dos pombos. Na minha mente, ganharam terreno instintos assassinos e fui congeminando planos maquiavélicos capazes de me devolver o sossego da madrugada.

Acabei por optar pela guerra psicológica. Espero, com paciência, aquilo que penso ser o pré-climax pombalino. Aí, puxo os estores com rapidez e ruído e assisto, com satisfação incontida, à fuga em voo dos casais depravados. Espero, no mínimo, provocar problemas graves de disfunção eréctil aos pombos da minha rua...

in Diario Digital.

1 Comments:

Blogger Pedro said...

Viva HUGO,
O texto está muito porreiro, a cor...
Quanto ao que li, aqui fica a minha opinião:
Sr. Mário Resendes, sinceramente... duvido muito que, mesmo na hipótese de serem pombos depravados, estes mereçam tal atitude em relação aos seus momentos de prazer.
Classificaria mesmo de completa atrocidade tal atitude, e não a desejaria nem ao meu pior inimigo, quanto mais a um pobre casal de pombos em pleno “refustedo”.
Aconselho-o a ter muito cuidado, pois tal acto pode tomar repercussões inimagináveis. Não se admire se, numa ocasião em que queira ter um pouco mais de intimidade, um bando de pombos despenteados, com as unhas grandes, olhos raiados e a espumarem pelo bico, decidirem atormentar a sua “private party”...
E se dois pombitos lhe tiram o sono, imagine o que não farão um monte deles ao seu apetite sexual???
Pior que uma mulher chateada, só um pombo desesperado...

quarta-feira, abril 20, 2005 10:08:00 da manhã  

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